segunda-feira, 14 de março de 2016

Entendendo a escolha dos pré-candidatos à presidência dos Estados Unidos

Os Estados Unidos estão passando por um processo já famoso e muito complexo, uma espécie de eleição prévia que acontece para serem escolhidos os candidatos, republicanos e democratas, que disputarão o cargo de presidente da nação. Para nós brasileiros essas votações são extremamente complicadas e, realmente, entender como esses tais candidatos são escolhidos não é tarefa das mais fáceis. 

Existem duas formas de escolha de pré-candidatos à presidência: eleição (primárias) e caucus.    

As primárias são divididas em abertas e fechadas e isso depende do modelo que cada Estado adota. Nas primárias abertas qualquer pessoa, independente do partido, pode votar em um pré-candidato de qualquer partido. Vale ressaltar, no entanto, que a pessoa só pode votar uma única vez. Já nas primárias fechadas o eleitor tem que ser registrado em determinado partido para poder eleger o pré-candidato daquele partido. Abertas ou fechadas, nas primárias os eleitores votam em delegados compromissados (pledged) que concordam em representar os interesses daquele eleitorado votando no pré-candidato escolhido por aquela comunidade. Vale ressaltar que os delegados são compromissados, mas podem mudar seu voto caso queiram (o compromisso é moral e não legal).

Os caucuses, por outro lado, são convenções partidárias que servem para escolher os pré-candidatos à eleição de forma indireta. Assim como nas primárias, podem ser abertos ou fechados. Nessa modalidade as pessoas de um bairro (condado) se reúnem nas células dos partidos (caucus) para escolherem os pré-candidatos que mais se alinham com seus anseios e interesses. Depois disso elegem delegados que - alinhados com delegados de outros bairros com que têm interesses em comum - escolhem os delegados municipais. Vários delegados municipais elegem os delegados distritais. Vários distritos, que têm em comum a simpatia de algum pré-candidato, elegem os delegados que na convenção estadual do partido definirão, por voto direto, o pré-candidato vencedor daquele Estado.

Para fins didáticos, imaginemos que o Rio de Janeiro fosse um Estado Americano qualquer, teríamos um caucus em Jacarepaguá, outro na Barra, outro no Méier e outro em Madureira que, alinhados, escolheriam um delegado x. Esses bairro reunidos teriam seus delegados representando uma fatia dos votos da Capital do Rio de Janeiro e assim, conseguindo delegados em Niterói, Nova Iguaçu e São Gonçalo, elegeriam os delegados da Região Metropolitana. Esses delegados distritais escolheriam delegados para representarem os interesses dessa comunidade na convenção do Estado do Rio (por exemplo uma convenção democrata) e, após votação direta com outros delegados, saberíamos quem venceu a prévia estadual.

Cada Estado adota o modelo que quiser (primárias ou caucus) e, apesar de em alguns Estados os próprios partidos organizarem essas prévias, muitas vezes a votação é organizada pelo próprio governo estadual, ou seja, com dinheiro público. Vale ressaltar que, como tudo, a eleições dos pré-candidatos vira um espetáculo nos Estados Unidos, tendo debates, festas, divulgacão na TV e até boca de urna. Por exemplo, sendo você filiado do partido democrata e chegando para votar nas primárias fechadas do seu partido no Estado da Flórida, não tenha dúvida de que receberá santinhos dos candidatos, propostas etc. 

No que tange as prévias de cada partido temos diferenças importantes entre os republicamos e os democratas que é a questão da proporcionalidade. Para os democratas se um Estado tem 30 delegados a apuração dos votos será sempre proporcional, sendo assim, se um candidato x tiver metade dos votos de um Estado e o y tiver a outra metade, cada um terá metade dos delegados daquele Estado. Os republicanos não usam essa lógica, eles têm Estados onde o voto é proporcional, mas em outros o vencedor leva tudo, ou seja, se o candidato x tiver 22 dos 30 votos, ele leva os 30 delegados do Estado. 

Nesse ponto vale ressaltar que cada estado terá um número de delgados de acordo com um coeficiente que levará em conta o tamanho do PIB, tamanho da população, representatividade na câmara, além disso, o número de delegados não é igual em cada partido: os democratas contam 4763 delegados, sendo assim, um pré-candidato precisa de 2382 para ser escolhido como candidato. No caso dos republicanos eles só precisam 1237 de um total de 2473 delegados. 

Outra diferença importante entre os dois partidos é que os democratas têm os chamados super-delegados (unpledged party leader, elected official delegates e unpledged add-on), que são os membros ilustres do partido (Bill Clinton por exemplo) e somam 712 votos do total democrata. Eles têm o voto livre, ou seja, não estão vinculados, comprometidos, com o voto popular, diferente dos “delegados normais” (pledged party leaders, elected officials e at-large) que são eleitos nas convenções estaduais e devem (mas não são obrigados como dito acima) votar conforme a escolha de seus representados (eleitores).

Os republicanos não têm esses Super-Delegados, são apenas aqueles eleitos pelos votos dos Estados. Muitos republicanos acham que isso é um problema, tendo em vista que a cúpula do partido acaba não tendo muita representatividade o que permite a eleição de candidatos aventureiros ou mesmo que não estão alinhados com a proposta do partido e, como é o caso do Donald Trump, que têm grande rejeição entre os próprios republicanos. Vale ressaltar que, no caso dos republicanos, existe ainda um cálculo complexo para se chegar ao número dos delegados at-large (vinculados para garantir a igualdade de gêneros), esse cálculo leva em consideração os Estados que deram vitória aos republicanos nas eleições anteriores e pode aumentar o número desses delegados. Resumindo, mais complicações. 

No final das eleições (primárias) ou caucus, os delegados irão se reunir na convenção nacional dos partidos para elegerem seus pré-candidatos e depois, ai sim, teremos os dois candidatos à presidência da republica tanto do partido democrata como do republicano.

Temos então, resumidamente, um processo que é diferente entre os dois partidos, que é diferente entre os estados (existem estados que usam, inclusive, caucus junto com eleições) e que, além disso, é muito criticado entre os próprios americanos. Vale ressaltar, no entanto, que os Estados Unidos não possuem sistema bipartidário, dezenas de partidos foram criados durante a sua história e, apesar de serem considerados micropartidos sem muita expressão nas eleições (principalmente presidenciais), têm seus adeptos.